aiceb: Uma História de Amor
(Livro em Construção)
1. RAÍZES
Nossas raízes estão ligadas, primeiramente, a um
grupo de crentes que morava na pequena cidade de Barra do Corda, liderado por
João Batista Pinheiro, um homem com muitos limites, mas com uma profunda
convicção de que era o instrumento usado por Deus para anunciar o evangelho
àquele povo. Pois “Deus escolhe as cousas fracas do mundo para envergonhar as
fortes.” (1 Co. 1:28).
1.1 Vida e Obras de João Batista Pinheiro
“Ele escolheu o que para o mundo é
insignificante, desprezado e o que nada é, para reduzir a nada o que é.” (1 Co.
1:28).
João
Batista nasceu em 1850, num pequeno povoado a sudeste do Ceará chamado Icó.
Filho de uma família muito pobre e, quando ainda criança, ajudando o pai na
lavoura, foi atingido no polegar do pé direito por uma enxada. Por causa disto
contraiu framboésia, uma erupção cutânea própria dos trópicos. Com o passar do
tempo a perna foi inchando e por causa das feridas, atraia muitas moscas,
piorando ainda mais a situação de João Batista. Não demorou muito para que todo
o seu corpo fosse atingido. Algumas
partes foram mais prejudicadas.
No nariz saiu uma ferida que em pouco tempo o
destruiu totalmente. Na adolescência, sua família o levou para a cidade grande
em busca de tratamento médico. Enquanto aguardava, vivia momentos de grande
esperança e ansiedade, pois não sabia o que de fato aconteceria com sua perna
já bem infeccionada. Os médicos fizeram tudo o que puderam, mas na tentativa de
salvar-lhe a vida, tiveram que amputar sua perna direita, o que o levou a
frustrações e desencorajamento.
Em 1877, a região Nordeste, mais especificamente o
sertão do Ceará, foi violentamente atacada por grande seca. O Governo, tentando
amenizar o sofrimento de seus liderados, providenciou meios para aqueles que
quisessem ir a outros lugares em busca de melhores dias. Tendo a família de
João Batista ouvido falar de que no Estado do Maranhão a vida era mais fácil e
com melhores condições, decidiu se mudar para o município de Viana. A viagem
foi árdua até chega ao seu destino. Mas não se arrependeu, pois as chuvas eram
regulares permitindo ao solo a produção abundante de frutas e legumes.
Com a
mudança climática brusca e problemas de adaptação, todos sofreram com febre e
outras enfermidades. Isto só piorou ainda mais o estado de saúde de João Batista,
obrigando sua família a buscar paragens mais saudáveis e que garantissem, pelo
menos, sua melhora. Nesta busca, em 1878, chegaram a Barra do Corda, onde se
radicaram definitivamente. Não terminaram aqui os seus sofrimentos. João
Batista, com o rosto deformado pela falta do nariz, sem a perna direita e sem
condições de trabalho, por causa das dores fortes e porque, de vez em quando,
arrebentavam as chagas por toda parte do corpo, vivia praticamente a mercê da
proteção dos parentes e das esmolas que recebia de pessoas caridosas.
Como se
não bastasse, a terrível doença também atingiu, de forma irreversível, a outra
perna. Após dois longos anos lutando contra a doença e sem conseguir bons
resultados João Batista viajou para São Luís, capital do Maranhão, em busca de
auxilio médico, mas de nada adiantou. Já sem condições de qualquer recuperação
a outra perna também foi amputada. Agora o futuro lhe parecia ainda mais
aterrador.
Após
um longo período confinado no hospital, breve João Batista teria que enfrentar
as ruas da cidade. O que lhe parecia uma terrível experiência. O medo era
grande, especialmente por causa de sua aparência, agora sem nariz e sem as duas
pernas destruídos pela doença. Seria difícil ignorar os olhares que lhe
lançariam. Seria difícil enfrentar o olhar casual desdenhoso daqueles que
passassem "do outro lado." E ainda tinha que zelar por sua segurança.
Em seu coração ecoava a grande interrogação: "Por quê?" Bem no fundo
havia uma necessidade de entender, um desejo de encontrar algo que satisfizesse
a ânsia de seu jovem coração amargurado.
Já recuperado da cirurgia
João Batista teria que voltar para perto dos familiares onde tinha sustento
garantido. Mas, em vez de voltar para Barra do Corda, resolveu tentar a vida em
Manaus - Am. Após dois anos, não atingindo por lá seus objetivos, retornou para
São Luís onde conheceu uma moça chamada Mariana. Esta moça estava disposta a
compartilhar de suas poucas alegrias e muitos sofrimentos. Ela, além de devotar
seu amor e cuidados ao longo de seu casamento, lhe presenteou com cinco filhos:
Azubal, José, Tadom, Antônio e Ezequias Batista Pinheiro. De São Luís retornou
para Barra do Corda.
Em
Barra do Corda João Batista aprendeu a viver dependente das esmolas públicas. E
já não ficava tão desapontado quando seu pedido não era atendido, pois no
coração ainda brotava uma pequena esperança de aparecer alguém mais caridoso
que lhe daria mirradas esmolas. Por causa da falta das pernas sua locomoção se
dava sobre uma tábua pequena com rodas. Com o auxilio das mãos, também
protegidas com couro, empurrava este improvisado assento que era preso ao seu
tronco.
As
condições de vida para ele pioraram muito visto que não poderia trabalhar e em
Barra do Corda não havia muitas opções para alguém com limitações como as suas.
A mendicância ali não lhe rendia o suficiente para sustentar a família. Com
isto João Batista resolveu deixar Mariana na companhia de seus parentes e tendo
ganhado passagens foi para São Luís e de lá, no seu limite físico, viajou no
porão de um navio até Recife-Pe., em busca de recursos financeiros que
garantissem o seu sustento.
Seu Encontro com Cristo
João Batista levava na bagagem uma imagem de “Nossa
Senhora da Conceição”, que pertencia a sua irmã. Ele a estava levando para
renová-la visto que já estava bem desgastada pelo tempo. A única forma que João
Batista conhecia de culto era através da idolatria. E aquela imagem, depois de
restaurada, serviria como companheira nas calçadas de Recife ao esmolar.
Serviria, também, como demonstração de sua devotada fé nas virtudes da imagem.
Com certeza aquela cena comoveria o coração dos, também, idolatras que lhe
dariam esmolas. Com isto, pensava ele, teria dinheiro para suas despesas
pessoais e, quem sabe, também o suficiente para guardar e levar para sua família.
Depois de algum tempo de sofrimento naquele vapor
por causa de suas condições físicas e escassez de dinheiro, João Batista chegou
a Recife e não demorou muito para conhecer os principais pontos da cidade.
Pelas ruas se arrastava em busca de pechinchas para aliviar-lhe a fome ou para
esquecer seu tão grande sofrimento.
Numa certa
noite depois de mendigar o pão, já bastante desanimado, foi atraído pela musica
e cânticos vindos de uma igreja Presbiteriana. Aproximou-se, parou na porta e
olhando para dentro da igreja viu que tudo aquilo era totalmente novo para ele.
Uma igreja sem altar, nem velas, enfeites ou imagens. Também era novo aquilo
que o pregador falava. Pela primeira vez ouviu sobre o evangelho que salva; o
único caminho para o céu; Jesus Cristo e o imenso amor de Deus para com o
pecador. Pela primeira vez ouviu promessas de vida eterna. Dali em diante
passou a visitar com mais freqüência aquela igreja. Reconhecendo seu estado
miserável e crendo nas palavras de redenção oferecidas por Cristo, poucos dias
depois O aceitou como o único que poderia salvá-lo. Isto aconteceu por volta de
1892.
Logo
em seguida foi alimentado espiritualmente pelos seus novos irmãos. Ele
tornou-se o ouvinte mais pontual daquele pregador. Também ganhou uma Bíblia e
convencido da verdade que havia em Jesus, João começou a estudá-la. Decorou
vários trechos (aqueles freqüentemente citados pelo pregador) e aprendia mais e
mais sobre a maravilhosa salvação oferecida por Deus a pessoas como ele mesmo.
Cristo agora era a razão de sua existência e a Bíblia, a fonte onde encontrava
conforto. A velha imagem que antes era
sua companheira de mendicância foi abandonada.
Consigo, agora, carregava a Bíblia. E a mendicância que antes era apenas
um meio de sobrevivência, agora se tornou uma oportunidade para falar de Cristo
aos seus benfeitores.
À
noite, em sua rede, ele refletia sobre o imenso amor de Deus, sobre o
desprendimento de Jesus ao tomar sobre Si a punição dos perdidos pecadores.
"Que perdão maravilhoso! E é meu para sempre," disse ele ao
reconhecer a graça de Deus. O moço conhecia muito bem o significado do
sofrimento e a angústia mental que resultavam da dor física, da ansiedade e da
solidão. Mas, o seu sofrimento
era pessoal, era resultado de doença. Por outro lado, o puro e santo Filho de
Deus havia suportado agonias inomináveis em seu corpo e em sua alma, em favor
de outros, porque os amava, mesmo sendo eles pecadores. Ele era o único que
poderia salvá-los porque era puro; o único que podia redimi-los e destruir
aquele que os trazia em servidão. "Aleluia," gritou João Batista
enquanto meditava no inigualável amor de Cristo para com os pecadores perdidos.
Como
esta mensagem era diferente da superstição, feitiçaria e falsos ensinamentos
que abundavam naqueles vilarejos ao longo do rio Mearim! João Batista tinha
muitos parentes em Barra do Corda. Começou a pensar neles, no temor que eles
tinham da morte e da vida futura e na servidão em que a feitiçaria os trazia.
Seus parentes e amigos ainda se encontravam presos pelos mesmos grilhões que um
dia o haviam prendido. Quanto mais pensava neles, na condição de escravos em
que se achavam, mais crescia a vontade de lhes compartilhar a maravilhosa
alegria que agora enchia o seu coração. A verdade que o havia libertado poderia
também quebrar os grilhões que aprisionavam os seus. Ele sentiu então a
necessidade de levar as boas novas até seus parentes em Barra do Corda.
Sua Visão
Missionária
Durante
a longa viagem de volta para o Maranhão passou por vários lugarejos esmolando
para se alimentar. Enquanto isso, aproveitava para falar do amor de Deus a
todos os que dele se aproximavam. Alguns davam a esmola, outros a negavam por
ser ele crente e outros davam com uma condição: “que a aceitasse em nome do
santo “fulano”. A estas, João Batista se recusava receber. Durante seu retorno
Deus providenciou para que nada lhe faltasse. Pessoas se dispuseram a ajudá-lo
no que fosse possível. O testemunho de João Batista era visto através de sua
coragem em vencer seus próprios limites
Ao
chegar a São Luis, João Batista encontrou um grupo de crentes. Contou para eles
suas experiências em Recife e como agora era uma nova criatura em Cristo Jesus.
O seu coração se alegrou junto com estes irmãos, onde aprendeu mais da verdade
e da segurança que a Palavra de Deus oferece aos que recebem Cristo pela fé.
Ele participava dos cultos fielmente e logo se tornou membro daquela igreja.
Cada dia aumentou mais o seu desejo de levar as boas novas de salvação aos seus
parentes em Barra do Corda.
Mas, como poderia um aleijado como ele viajar
sozinho de barco pelo rio a cima até Barra do Corda? Alguém precisaria ajudá-lo.
Só de pensar que teria de entrar e sair da barcaça várias vezes durante cada
dia da viagem para satisfazer suas necessidades fazia com que sua idéia
parecesse impossível de ser realizada. Mas, não havia ele ouvido o pregador
afirmar que para Deus nada é impossível? João Batista estava convencido de que
Deus tinha um plano para ele. O Deus que nunca falha havia colocado um grande
desejo em seu coração e, certamente cumpriria estes planos.
João
Batista foi conversar com seus novos irmãos daquela pequena igreja. Eles oraram
juntos e lhe prometeram fazer tudo que estivesse ao seu alcance para ajudá-lo.
Arranjaram-lhe as coisas que precisaria, deram-lhe um hinário e uma Bíblia e o
levaram até a barcaça que já estava abarrotada de caixotes, passageiros e sacos
de aniagem com sal bruto. Ajudaram-no subir a bordo e prometeram que se
lembrariam dele em suas orações. A lancha se aprontava para rebocar a barcaça,
que o povo do norte chamava de batelão, rio acima. A viagem tinha uma duração
aproximada de duas semanas. Corajosamente João Batista acenou em despedida para
seus novos irmãos em Cristo.
Em 1893,
retornou para Barra do Corda a fim de anunciar as boas novas aos parentes e
amigos. Sabia das dificuldades que certamente enfrentaria por causa dos seus
limites, mas ardia em seu coração o desejo de pregar para outros e cria que
Deus o ajudaria no retorno para sua cidade. Foi assim que empreendeu uma longa
viagem até seu campo missionário, Barra do Corda situada as margens daquele
rio.
Como
as demais, esta foi uma viagem muito incômoda, pois lhe faltavam ambas as
pernas para sua locomoção. Tanto os passageiros como a bagagem no batelão eram
protegidos do sol e da chuva por um teto de folha de palmeira. Havia pouco
espaço para se mover; havia sacos e engradados por todo lado. João Batista
precisaria de ajuda para tudo, até para atar sua rede para o descanso da noite.
Entre os passageiros encontrou alguns que, vendo sua precária condição, se
dispuseram a ajudá-lo em tudo que pudessem. Penduraram sua rede num nível mais
baixo, de forma que ele pudesse se arrastar sozinho para dentro. A hora das
refeições, aquelas mesmas pessoas prestativas lhe enchiam um prato esmaltado de
arroz e feijão retirados de grandes panelas de ferro, que ficavam na popa do
batelão sobre fogão à lenha.
O
sabor da comida a bordo fez João Batista relembrar sua vida no interior. Para
temperar o conteúdo de cada panela o cozinheiro usava um punhado daquele sal
bruto. Com grandes colheres de pau ele retirava a espuma que se formava em cima
da água fervente. O sal era muito impuro e o que não era sal tinha que
ser retirado e jogado fora.
Mesmo assim, o arroz e o
feijão feitos ali mantinham aquele sabor distinto do sal bruto.
Durante a viagem ele aprendeu muitas e preciosas
lições do Senhor. Uma delas foi a importância daquele sal tão grosseiro, sujo e
feio que estava no batelão, mas que tinha a utilidade de dar sabor ao alimento
que o sustentou durante aqueles dias. Aplicou aquela lição à própria vida
reconhecendo que não era a aparência física que influenciava. Sabia que ainda
era imperfeito como aquele sal grosso, mas que Deus o refinaria e o
transformaria em algo útil para o Seu trabalho. Reconheceu que o importante era
a vida com Deus e o conhecimento de Sua Palavra. João Batista aprendeu na
Palavra que ele era o sal da terra “Vos sois o sal da terra.” (Mt. 5:13)
Será que todo aquele sofrimento pelo qual ele
estava passando não era a poderosa mão do Senhor refinando-o para ser muito bem
usado? Ele aprendeu a lição e agora estava disposto a desempenhar o papel de
“sal da terra” no meio daquela geração perversa que morava em Barra do Corda.
Seus companheiros de viagem reconheceram que havia algo diferente em João Batista.
Eles ficavam impressionados com a coragem daquele aleijado em vencer suas
próprias dificuldades. João era grato por tudo o que ali faziam por ele, e se
mantinha sempre alegre e amigo.
Seu Campo de
Trabalho
Ao
chegar a Barra do Corda muitas foram as mãos que se dispuseram ajudá-lo a sair
da lancha. Seus parentes e amigos vieram recebê-lo e logo notaram grande
diferença em João Batista. Não estava triste e abatido como todos esperavam.
Apesar de não ter mais as duas pernas, sua aparência era boa e saudável.
Parecia feliz e de fato estava. Todos queriam saber das noticias da cidade
grande. João Batista não economizou nos detalhes. Mas, existia algo mais
importante que ele queria compartilhar. Como ansiava pelo momento de falar para
todos sobre a salvação em Cristo.
João havia voltado ao interior exclusivamente
para divulgar a grande salvação, mas ninguém parecia querer ouvi-o. Mesmo assim
ele aproveitava cada oportunidade para testificar de Cristo àqueles que só se
interessavam por suas experiências nos hospitais e nas viagens. Mas, a única
coisa que ele conseguia era despertar o ódio e desejo de perseguição dos
cordinos. Isto o deprimia. A Bíblia e a comunhão com Deus o reanimavam muito e
o relembravam da gloriosa missão para a qual foi enviado - “Vós sois o sal da
terra.” Deus havia lhe dado aquela missão e junto, também, lhe deu um grande
amor e determinação.
Barra
do Corda era território de Satanás há muito tempo. O medo aterrorizante de ser
punido pela feitiçaria, e por seus deuses por dar ouvidos aquela nova religião,
criou uma atmosfera de ódio e violência do no povo contra ele. A irmã de João Batista, dona da imagem que
ele havia levado para Recife, também não estava muito satisfeita por ele ter
dado fim naquela tão preciosa relíquia. Mas, apesar de tudo, João continuava se
reunindo com os que queriam ouvir da Palavra de Deus e aproveitava para dizer
que a idolatria era abominação ao Deus verdadeiro.
A
notícia se espalhou rapidamente e logo chegou aos ouvidos do padre responsável
pela paróquia em Barra do Corda. Durante
uma reunião dominical, quando João Batista estava com alguns parentes e amigos
estudando a Bíblia, sua casa foi violentamente invadida por alguns homens que
tinham o propósito de atacá-lo por ordem do padre. Arrancaram de suas mão a
Bíblia e foram entregá-la diretamente ao padre. A noite foi feito uma fogueira
na praça da cidade, em frente da Igreja Católica e, como sinal de zelo e sob a
aclamação dos fanáticos católicos, o padre lançou o Livro Sagrado dentro do
fogo, reduzindo-o a cinzas. O objetivo deste insano ato era de intimida João
Batista.
Agora
estava o missionário sem sua ferramenta. Mas, perseverou na determinação de
pregar o evangelho. Sem demora ele
escreveu uma carta aos irmãos em São Luís pedindo mais Bíblias. Pediu também
que os irmãos orassem pela sua segurança pessoal. A vida ali para ele estava
muito difícil e perigosa.
Enquanto esperava a chegada das Bíblia, João
Batista continuou falando às pessoas sobre Cristo, recitando os trechos da
Bíblia que já havia decorado. Também cantava hinos que traziam a mensagem de
vida eterna. Arrancaram-lhe a Bíblia, mas não puderam arrancar de seu coração o
conhecimento de Deus e amor em anunciar Sua Palavra. Em um deste dias, foi violentamente atacado
por uma turma de vadios inimigos do evangelho que o ridicularizavam, o
agrediram fisicamente com os pés e até o apedrejaram. Ali foram derramadas as
primeiras gotas de sangue em Barra do Corda em defesa do evangelho. Vendo
aquela horrenda cena, o Juiz de Direito, que a tudo assistia, correu em sua
defesa e o livrou daqueles jovens mal intencionados, ameaçando-os severamente.
A
onda de oposição que estava se formando finalmente começou a perder força, pois
viam que a vida de João Batista era um exemplo vivo da mensagem transformadora
de Cristo. O efeito, tanto do seu testemunho quanto de sua pregação, foi tão
grande que aos poucos as pessoas foram aceitando Cristo como Salvador. Sua
sobrinha foi uma das primeiras a aceitar Cristo, fazendo sua profissão de fé
pública. A partir de então, um por um de seus parentes se converteram,
abandonando as práticas religiosas falsas. Pacientemente ele começou a ensinar
esta pequena congregação tudo o que havia aprendido sobre Deus. Ensinava os versículos e os hinos que havia
decorado e que se tornaram preciosos. João Batista e a congregação continuaram
orando pela chegada das Bíblias que ansiavam por receber.
Tempos depois chegou a resposta de sua carta. E em
lugar de apenas um exemplar da Bíblia estavam chegando quatro. Ao entregar o
pacote a João Batista o agente dos Correios fez o seguinte comentário: “É bom
que o padre não queime estas, porque senão virão dezesseis Bíblias.” A
preocupação de todos era se os inimigos do evangelho também queimariam estas
Bíblias. Mas, Deus não permitiu que isto acontecesse. As preciosas páginas
foram lidas e relidas por aqueles que sabiam ler e todos foram edificados.
Através da leitura da Bíblia João Batista viu muitas pessoas conhecendo a
Cristo; vidas sendo transformadas; hábitos pecaminosos sendo abandonados.
Os
anos se passaram e, após muitas experiências difíceis, surgiu uma pequena
igreja em Barra do Corda. Com o coração agradecido, João Batista viu bons
frutos produzidos nas vidas dos crentes. Aquela comunidade que nunca se
permitira ouvir o evangelho, agora estava sendo transformada pelo poder deste
mesmo evangelho. Um grupo de doze famílias salvas se tornou um exemplo de vida
cristã para seus vizinhos curiosos e também hostis. Aos poucos outros foram se
convertendo e se ajuntando a seus novos irmãos em Cristo.
Em 1901 as famílias Barros, Caetano, Pinheiro e
outras já haviam aceitado a Cristo através do testemunho de João Batista. Eram
famílias que viviam do cultivo da terra e, como também compartilhavam da mesma
fé, decidiram comprar uma propriedade no lugarejo chamado Lagoa da União,
município de Barra do Corda, ficando distante de lá 30 km . Formaram ali uma
pequena colônia onde poderiam cultivar a terra e sua fé. Algumas pessoas
chamavam aquele lugar de “Centro dos Protestantes”. Abdoral Fernandes da Silva
o descreveu assim:
Era uma localidade
no centro mais denso da mata, destinada ao abrigo de famílias crentes e pobres
que se ocupava de cultivar o solo. Era mata sem fim, sem medida, requerida pelo
sistema antigo de posse, cujos limites não se conheciam. Naquele lugar não
morava ninguém de outro credo. (SILVA, 1997, p. 16)
Logo uma pequena congregação evangélica surgiu em Barra do Corda como
resultado do grande esforço de um homem aleijado do corpo, mas com o coração
inteiramente dedicado a pregação do evangelho. O grupo crescia e se tornava
cada dia mais carente de conhecimento bíblico. Todos oravam incessantemente ao
Senhor pedindo que suprisse a urgente necessidade de mais instrução e conforto
diante dos permanentes ataques satânicos. Em 1907 receberam como resposta das
orações a visita do primeiro missionário naquela região, Sr. Mackenzi.
Em 1910,
o missionário W.M. Thompsom, pastor da Igreja Presbiteriana em Caxias - Ma,
andou 70 léguas a cavalo até Barra do Corda, para ver de perto aquele punhado de
remidos perseverantes. Ali foram confortados mutuamente e antes de sair o Pr.
Thompsom prometeu ao grupo que a Igreja em Caxias daria todo o apoio necessário
àquela congregação e que, a partir daquela data, ela estaria anexada ao seu
campo de trabalho. Nascia naquele momento uma congregação presbiteriana.
Minorou um pouco as necessidades, mas João Batista
não estava totalmente satisfeito, pois era necessário alguém que servisse
permanentemente ali. Ele já não dispunha de boas condições físicas visto que a doença
agora já atingia a visão e audição. As repetidas crises de febre tornavam ainda
mais espinhosa a vida daquele missionário. Destinado a viver preso dentro de
uma rede, João Batista passou a liderança do trabalho para seu cunhado Joaquim
Pinheiro e, pouco ia aos cultos. Quando isto acontecia era resultado de extremo
esforço para chegar até lá.
Os anos se passaram e João
Batista já velho, doente, cego e praticamente surdo, limitado tanto fisicamente
quanto de conhecimento, sentia que aquele grupo necessitava de mais alimento da
Palavra. Piorando cada dia e não tendo mais condições de sair em busca do
sustento, se deixava ficar na rede a qual foi transformada em altar de oração e
ali elevava a Deus o constante pedido: “Pai, manda alguém de tua escolha para
ensinar a estes crentes a Tua Palavra, para que possam aprender a evangelizar,
aprender também a alegria de testemunhar, para se tornarem o sal verdadeiro
nessa região a fim de que Teu nome seja engrandecido. Amem.”
Resposta
de Suas Orações
Em Grajaú, cidade também do interior do Maranhão,
há 200 km
de Barra do Corda, residia os missionários Perrim e Ana Smith.[1] Em
1911, de passagem para São Luís, chegam a Barra do Corda onde embarcariam para
a Capital. Milagrosamente a lancha que os levaria nesta viagem precisou demorar
no porto. O casal de missionários, já tendo ouvido falar do trabalho realizado
por João Batista, decidiu ir até sua casa para conhecê-lo. Quando os visitantes
chegaram, o velho evangelista não teve dúvidas de que suas orações tinham sido ouvidas
e que o casal era a resposta de Deus. Não podendo esconder a alegria num brado
disse: “Hoje Deus respondeu minhas orações.” Agora seu coração poderia
descansar sobre o futuro do trabalho que havia começado. E como Simeão ele
também poderia dizer: “Agora Senhor, despede em paz o teu servo.” (Lc 2:29).
Dali
em diante, sempre que podia, Perrin Smith dava assistência àquela congregação e
naquele ano realizou mais de 30 batismos. Os crentes lhe pediram para conseguir
alguém que pudesse cuidar daquele rebanho tão carente de pastor, pois João
Batista já não poderia mais ajudar devido o seu estado de saúde bastante
comprometido. Em atendimento ao apelo feito, Smith se comprometeu em
transferiria suas atividades missionárias para Barra do Corda assim que retornasse
de suas férias no Canadá. Em 1914, como
havia prometido o casal Smith, ao retornar do Canadá, fixou residência em Barra
do Corda e continuou o trabalho de evangelização iniciado por João Batista ali
na pequena cidade indo com a mesma mensagem por varias cidades e lugarejos do
Maranhão.
A Despedida do
Missionário
Ainda dois longos anos de sofrimento físico se
passaram. No dia 22 de março de 1916 João Batista acordou com febre baixa
apesar de estar muito desfalecido por causa das febres altas passadas. Chamou
sua filha Azubal e com muita dificuldade, mas com convicção, disse as palavras
de Paulo: “Acabei minha carreira”. Poucos minutos depois aquele dia se tornava
o melhor de toda a sua existência, pois estava com o Senhor, o que era muito
melhor.
Resultados
do Ministério de João Batista
Com a chegada de Perrin Smith em Barra do Corda
para continuar a obra iniciada por João Batista a cidade foi transformada em um
centro de expansão missionária. Aquela congregação, agora igreja organizada,
estava prestes a se tornar a mãe de mais uma denominação evangélica no Brasil.
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